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As Relíquias de S. Filipe e de seu companheiro

As relíquias são objetos preservados para efeitos de veneração religiosa. Podem ser objetos pessoais ou partes do corpo de um santo ou figura sagrada. São normalmente guardadas em recetáculos próprios designados por relicários.
Existem relíquias de diferentes graus:

1º grau – partes do corpo: ossos, cabelo, sangue, pele mumificada;
2º grau – objetos de uso pessoal do santo: roupas, rosários, crucifixos;
3º grau – objetos que apenas tocaram no corpo do santo: lenços, pedaços de tecido, etc.

As relíquias encontradas numa inventariação realizada na igreja matriz de Montemor-o-Novo terão pertencido a S. Filipe e a um seu companheiro sendo consideradas de 1º grau uma vez que se tratam de partes do esqueleto – o crânio.

S. Filipe foi um apóstolo de Jesus Cristo, tendo sido mencionado em vários acontecimentos importantes da sua vida. O companheiro de S. Filipe poderá ser S. Tiago Menor, também considerado apóstolo e incluído no grupo de pessoas que viram Jesus Ressuscitado. As principais relíquias dos dois apóstolos encontram-se na Igreja dos Doze Apóstolos, em Roma. Na aldeia de Arsos, em Chipre, também é venerado um crânio atribuído a S. Filipe.

Estas relíquias reencontradas em Montemor-o-Novo em 2020, pertenciam ao imperador Frederico III do Sacro Império, tendo sido depositadas no Reliquienschrein (Relicário Imperial) da catedral de S. Jorge, na cidade de Wiener Neustadt. Durante a coroação de Maximiliano I como Rei da Hungria e Croácia (1527-1576), o imperador do Sacro-Império Fernando I (1504-1564) concedeu uma carta-patente a D. João Mascarenhas para levantar as relíquias na Áustria.

D. João posteriormente levou-as, a seu tio D. Fernão Mascarenhas, Alcaide-Mor de Montemor-o-Novo e representante de Portugal no Concílio de Trento, que as trouxe para Montemor-o-Novo. No dia 23 de abril de 1577, D. Fernão Martins Mascarenhas realizou contrato com os religiosos do Convento de S. Francisco e aí decidiu depositar as relíquias no altar-mor da igreja.

A festa de S. Filipe realizada antigamente no dia 1 de maio, tinha sermão e missa cantada na igreja do Convento de S. Francisco. Daqui os relicários eram levados em procissão até à igreja de Nossa Senhora da Luz onde ficavam expostos à veneração dos fiéis. Na mesma ocasião, eram distribuídos pelo povo algodões tocados pelas relíquias para devoção popular.

É com esta festa que se inicia a Feira de maio. Em 1702, D. Pedro II outorga carta de alvará permitindo a venda de cavalos nas feiras anuais, referindo-se à Feira em dia de S. Filipe (feira de maio) e à da Luz (primeiro domingo de setembro).

O mau estado de conservação em que os bustos relicários se encontravam eram resposta ao esquecimento que lhes foi votado e ao arrefecimento do culto e devoção aos mesmos. A intervenção de conservação e restauro realizada em 2021/2022 pretendeu, por um lado, estancar a degradação dos materiais, e por outro restituir, tanto quanto possível, a sua dimensão estética. Procurou-se um resultado equilibrado entre as duas peças atendendo ao diferente estado de degradação. Foi assim feito o tratamento do suporte (desinfestação, revisão estrutural, preenchimento volumétrico, tratamento de elementos metálicos) e tratamento da superfície dourada e policromada (fixação, limpeza, preenchimento de lacunas e reintegração).

Tecido medieval com a inscrição “F.R.I 1462”. A sigla traduz a expressão “Fredericus Romanorum Imperator”.

O estudo antropológico revelou que o primeiro relicário continha uma calota craniana bem preservada, pertencente a um indivíduo com traços femininos com mais de 30 anos de idade à data da sua morte. O osso frontal encontra-se ornamentado com o claro objetivo de ser exposto.

O segundo revelou um crânio fragmentado em vários pedaços e outros ossos, pertencentes a pelo menos dois indivíduos adultos do sexo masculino, embrulhados num tecido medieval com a inscrição “F.R.I 1462”. A sigla traduz a expressão “Fredericus Romanorum Imperator”, associada ao monograma do Imperador Frederico III, o primeiro Imperador do Sacro Império Romano Germânico da Dinastia dos Habsburgos.

Em conclusão, estas duas peças de arte sacra são de grande importância para a história de Montemor-o-Novo. Umas das relíquias mais importantes da Dinastia de Habsburgo, foram doadas à família Mascarenhas, a família dos Alcaides-mor de Montemor-o-Novo e colocadas, em 1577 no Convento de São Francisco de Montemor-o-Novo. Daí seguiam para a Igreja de Nossa Senhora da Luz em procissão, todos os dias 1 de maio, até que, por várias circunstâncias históricas, religiosas, políticas e culturais, este culto das relíquias se desvaneceu e elas acabaram por cair em esquecimento.

Poderão saber mais sobre estas peças através da exposição das relíquias de S. Filipe e S. Tiago patente na Sala do Capítulo de S. Domingos, até maio de 2024 e através do Documentário disponível no Youtube da Morbase.

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